Qual é o sentido da vida?
Existem formas diversas de responder a esta questão, que originam sentidos de vida diferentes, mas todos eles possuem um objetivo comum: A felicidade. A felicidade porque é o sentimento expresso ao sentirmo-nos bem connosco e com a nossa vida. O humano é movido de forma a conseguir ser feliz na sua vida, de um modo geral. Procura satisfazer as suas necessidades, procura fazer o que gosta de fazer, ter saúde, ter dinheiro, ter um bom ambiente social ou familiar… Todos os exemplos enumerados pertencem ao conceito de felicidade do senso comum contemporâneo. Mas, na verdade, a felicidade é algo muito íntimo, cada pessoa tem a sua forma de ser feliz, apesar de ser parcialmente moldada à moral da sociedade em que se insere. A felicidade é o objetivo supremo do sentido da vida humana, na maior parte dos casos.
Desde a antiguidade clássica que se coloca esta questão, afinal, esta é uma das maiores questões que se pode colocar à existência humana. Qual é o sentido da vida? Em outras palavras, para que é que vivemos, afinal? É com resposta na felicidade que se começam a traçar as primeiras doutrinas: Aquilo que devemos fazer para ser felizes e viver uma vida digna de se viver.
O estoicismo defendia que a virtude é o único caminho para se atingir a verdadeira felicidade. Estas virtudes do Homem são os seus conhecimentos e valores – a sua racionalidade, a característica mais importante e valorizada da nossa raça.
A felicidade era vista como uma realização por conseguir chegar o mais perto possível ao divino – Só era possível descobrir o verdadeiro sentimento de felicidade através da racionalidade incondicionada. É devotar àquilo para que nascemos. É ser feliz por ser sábio.
Para os estoicistas, o Homem deve fazer uso quase exclusivo destas virtudes, pois os sentimentos externos são vistos apenas como uma distração no percurso da sabedoria. Assim, eles valorizam a apatia/ indiferença perante os sentimentos, tomando apenas decisões lógicas. Não significa que estes não tenham sentimentos, mas sim, que os ignoram, para cada ação que executam, assumindo sempre total responsabilidade pelos seus atos.
Por outro lado, o epicurismo vai de encontro à felicidade através da simplicidade do ser e contemplação da vida. Para Epicuro, o prazer é algo fundamental para se ser feliz, mas apenas o prazer moderado, aquele que se preocupa em satisfazer as necessidades pequenas, evitando a dor, e proporcionando uma realização adequada para a vida.
O luxo sai dos limites de prazer moderado, pois não é necessário para se ser feliz, pelo contrário, o luxo habitua o corpo a grandes prazeres, que podiam facilmente proporcionar os sentimentos negativos, na falta destes, se a vida se tornasse simples. Assim, o Homem deve preocupar-se com o essencial para viver a sua vida sem grande dificuldade e contemplar as pequenas coisas da vida enquanto trilha o seu caminho.
Para o epicurista, a felicidade é aproveitar a vida de forma simples. É viver bem, em comunhão com os prazeres e sabedoria. É relacionar-se com o mundo à sua volta positivamente e aceitar a finitude natural. Não se deve temer a morte, pois após a morte não sentiremos nada, não seremos o quem somos hoje. É o hoje e a vida o foco epicurista, e é isto que devemos abraçar para ter plena felicidade.
A religião de cada um também tem um papel importante na conceção pessoal de felicidade. Os crentes seguem os dogmas impostos pela sua religião, “regras” diretas do divino para alcançar a felicidade suprema.
No cristianismo, acredita-se que existe vida após a morte e por conseguinte um paraíso e um inferno. O paraíso é uma promessa de felicidade eterna, enquanto que o inferno é o inverso. Um é a recompensa dos crentes que seguiram à risca todas as exigências impostas por Deus, já o outro é o castigo para os pecadores e infiéis. Assim, o cristão para se sentir feliz e sem o medo da morte, segue à risca todas as imposições da igreja, que podem ser interpretadas como o sentido da sua vida, pois se não o fizer, vive desesperadamente, temendo ansiosamente o fim da sua vida, pois acredita que lhe espera o eterno sofrimento.
Para os hinduístas, o caminho para a felicidade é traduzido pelos Purusharthas: Artha, a segurança de ter o conforto material necessário para viver no mundo com tranquilidade; Kama, é o prazer que traz uma sensação de deleite à vida; Dharma, a maneira correta de viver e comportamentos humanos considerados necessários para a ordem das coisas no mundo; e Moksha, quem nós somos, a autorrealização e autoconhecimento. Através de um equilíbrio entre os Purusharthas, o hindu encontra a felicidade. Este é o sentido da vida para eles.
Por fim, chegamos ao Niilismo, uma visão cética do mundo, aquela que vem “matar os deuses”. Ao contrário de todos as outras doutrinas e filosofias, o niilismo afirma que não existe um sentido para a vida, portanto não existe um caminho para a felicidade. Não há resposta ao nosso “porquê”, apenas existimos porque sim, “e porque sim não é resposta”.
A vida não tem valor porque não tem objetivo. Num universo infinito, a existência humana, junto com todas as suas ações, felicidade e sofrimento, resume-se a nada. Somos apenas um ser proveniente de reações químicas e biológicas do planeta Terra, tal como o resto dos seres vivos, e tal como estes, não temos, nem devíamos querer ter, uma razão de existir: Sobreviver, reproduzir e morrer, é apenas este o sentido da nossa existência animalesca. Mas mesmo já este ciclo não é mais necessário, pois o planeta não necessita de mais humanos, melhor seria se simplesmente não existíssemos ou que não fossemos capazes de raciocinar e nos colocássemos no mesmo patamar que os restantes seres. Pelo menos desta forma, não sofreríamos através do intelecto.
Existimos para viver, vivemos para existir e existimos por obra do acaso. Daqui não se pode espremer um significado maior para a nossa vida. Esta é a nossa única função: Existir. Por isso, quem aceita a ignorância é capaz de ser mais feliz do que aqueles que buscam por significado e resposta continuamente, podendo acabar iludidos ou então sem nunca a achar (porque é impossível achar), mergulhando num mundo cada vez mais angustiante, apenas à espera do dia em que a vida chega ao fim, sabendo que mesmo esse momento terá sido em vão e que apenas após o mesmo cessará a procura inquietante pelo seu motivo existencial.
Os niilistas partilham com os existencialistas a angústia da liberdade. Assumimos que somos responsáveis pelos nossos atos, que não temos qualquer obstrução divina, ou regra sobre nós que nos impeça de fazer algo. Por exemplo, somos o único ser capaz de nos suicidar por vontade própria, vontade que não encontraremos em nenhum outro ser vivo pois esses regem-se apenas e só pelos instintos e sentimentos. Este exemplo é o mais usado para explicar esta angústia da liberdade: Á beira de um penhasco, não temos apenas o medo instintivo de cair, também temos o medo de nos atirarmos. Coloca-se a afirmação: “Nada me impede de saltar”. E por vezes colocamo-nos mesmo a imaginar como seria se decidíssemos saltar. A nossa racionalidade atribui-nos capacidades autodestrutivas.
Ao mesmo tempo que sentimos a responsabilidade sobre tudo o que ocorre na nossa vida e a liberdade que temos perante as nossas ações, também nos sentimos aprisionados neste “mundo sem luz”. Nós estamos condicionados pelo corpo e a realidade para nós é a forma como o corpo reage ao ambiente em volta. Mesmo a nossa racionalidade provém de um cérebro físico e está condicionada por ele, cuja capacidade não é infinita, nem tampouco perto disso. Desta forma, acredito que a realidade possa ser muito mais do que aquilo que “nós pintamos”, mas que não temos formas de sequer pensar numa realidade diferente à nossa: Seria como pensar numa nova cor, para nós, impossível. A realidade é uma ilusão criada por nós.
Assim, classifico a existência humana niilista sufocante e desesperante para quem escolhe não se iludir por outras crenças. Só sobra ao niilista viver a sua vida vazia até ao fim, ignorando, sempre que possível, esse vazio deixado pela incerteza da realidade e pela insignificância da vida, seja ela que vida for.
O niilismo aceita que a vida não tem sentido, então não vale a pena viver o absurdo. Vive quem escolhe viver. Aqui coloca-se então o problema/solução do suicídio.
Perguntei à minha mãe: “Porque é que vives e escolhes não te matar?”. Vindo de alguém que passou a maior parte da sua vida a trabalhar, com muitos desgostos e pouca sorte na vida, na saúde e no amor, que trabalha como mão de obra numa fábrica que não gosta e a receber dinheiro que mal chega para a sustentar, respondeu “Porque tenho duas filhas que gosto muito para cuidar”. Voltei a insistir na pergunta para obter umar resposta mais aprofundada: “Porque gosto de viver, ora essa!”.
Ambas as respostas partem do sentimento. A primeira revela a responsabilidade de uma mãe. Ou seja, faz parte do instinto de muitas espécies, incluindo a humana, de a mãe cuidar dos seus filhos, independentemente do que aconteça. É o instinto e sentimento praticamente inescapável, que rompem com a vontade do suicídio. Não que ela deixe de ter vontade de se suicidar, porque já muitas vezes lhe passou pela cabeça e o exprimiu em momentos de maior aflição com a vida, mas nunca o fez, pois a necessidade de proteger “as crias” é relativamente maior. As forças naturais do corpo, incluindo os sentimentos, são capazes de sobrepor-se à razão. Isso vale também para os medos e instinto de sobrevivência. São muitas vezes estes que travam o suicídio, se é que travam.
Naturalmente, não se trata apenas de instintos implícitos nesta resposta, mas também a ética e moral da sociedade em que reside que moldam a sua forma de pensar e agir. É errado, para ela, suicidar-se enquanto está a encarregue de duas filhas. No ponto de vista dela, e de muitos, o suicídio, nesta situação, seria visto como covardia. Uma fuga aos seus problemas e o abandono das duas. Ela seria “castigada” pela sociedade. A religião em nada intervinha na sua ação pois ela não é crente.
Já a sua última resposta, em que ela afirma que gosta de viver, é bastante contraditória ao estado da sua vida passada e presente, que traduzida numa palavra, é miséria. Felicidade tem mais que se lhe diga do que uma avaliação do público geral, pois como eu disse no início, é algo íntimo, parte de cada um. Apesar de ter uma vida assim, existem algumas coisas na sua vida que lhe dão motivos para querer viver e para gostar de viver. Para ela, o principal é a família. Já lhe basta ter alguns momentos em que se sente realizada por ter uma família que ama a seu lado, mesmo que tudo o resto esteja contra ela ou que haja mais discussões em casa que “boas conversas”. Mas mesmo que sejam escassos, são momentos únicos e são bons de se viver. Se estivesse morta, seria incapaz de os viver. “Quando uma canção consola alguém, valeu cantar” – Oswaldo Montenegro; Quando a vida tem momentos felizes, já valeu viver, uma frase bastante epicurista, pois é assim que defino a minha mãe.
Mas para um niilista radical, que acredita que não existe qualquer sentido, o suicídio é a solução final para o sofrimento. Para que um niilista autêntico não se suicide só podem existir dois motivos, de acordo com o meu ponto de vista: Ou ele é impedido pelos instintos e cede aos mesmos, ou seja, não tem a força mental suficiente para acabar com a própria vida, ou então prefere sofrer. Talvez porque quer ter a experiência completa de uma mísera vida humana já que é a única que vai ter, ou talvez porque prefere sofrer a não sentir nada, ou talvez porque gosta de sofrer. Se nada disto for verdade, então só mesmo o suicídio é a saída mais rápida, pelo menos mais rápida que esperar que a morte venha a seu encontro.
E aqueles que não têm a força necessária, seria preferível que se fizessem de ignorantes à própria insignificância e que tentassem viver a vida por outro sentido, que tentassem chegar o mais perto possível da felicidade, pois o niilista é o humano com menos razões para ser feliz e é ao mesmo tempo o humano que melhor aceita os factos e prefere a “realidade” à ilusão, mesmo que isso lhe custe um sentido para a felicidade.
Qual é o sentido da vida?
O sentido da vida é relativo a qualquer pessoa, e tanto pode existir como não. Para os que existe, o sentido da vida é alcançar a felicidade/ realização através das suas crenças: Racionalização, contemplação e devoção ao divino. Para outros, não existe sentido e a vida é desta forma indiferente.
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Finalmente sou maior de idade, estou livre, foi o que eu pensei. Mas com esta liberdade eu isolei-me, como costumava fazer antes, mas pouco, e graças à bênção que me deram devido à situação pandémica, fi-lo ainda com menos remorsos. Fechei-me no quarto em frente ao computador, dia após dia, o meu paraíso outrora. Foi o ano todo assim. Comecei a viver numa rotina miserável, perdida. Comia muito pouco, o suficiente para não morrer. Não tinha mais vontade de fazer o que gosto, as minhas pernas desabituaram-se a suportar o meu peso, assim como eu me desabituei à minha própria existência, focando toda a minha atenção no ecrã à minha frente, este que tanto me abstrai de tudo o resto como tira lentamente as forças para me levantar daquela cadeira e agir como uma pessoa.
Nos pequenos intervalos em que voltava a mim, perguntava o que estava eu a fazer com a minha vida, e qual era o sentido daquela vida. Entre estes pensamentos sentia que tanto ter aquela rotina quanto estar morta era o mesmo, apenas mudava o facto de que tinha razões para ser um peso na sociedade e as perguntas sem resposta não me afetariam mais. E eu não conseguia mudar, apesar de saber que dar um passeio ajuda, socializar ajuda… O meu corpo e mente recusavam-se a mexer. Sentia que estava tudo errado, mas não havia forças para fazer o certo.
Colegas, ex-namorados e família, muitos revelaram comportamentos e pensamentos suicidas. Agora eu também pensava nisso com regularidade. Foi por isso que decidi escrever sobre o sentido da vida, foi num sentido de auto-descoberta e de conhecer as razões dos outros. Acredito que o meu objetivo foi concluído: Vejo-me alguém bastante niilista. Acredito no que diz a ciência, não acredito em vida após a morte ou que exista um motivo para a nossa existência. Somos mesmo uma raça animal que dispõe da inteligência para sobreviver. Um dia tudo morre e não haverá qualquer rasto da vida. No entanto também tento me iludir com a doutrina epicurista, para evitar uma vivência mórbida, como foi a deste ano pandémico.
Sites visitados:
https://www.significados.com.br/estoicismo/
https://educacao.uol.com.br/disciplinas/filosofia/filosofia-e-felicidade-o-que-e-ser-feliz-segundo-os-grandes-filosofos-do-passado-e-do-presente.htm
https://pt.wikipedia.org/wiki/Sentido_da_vida
https://pt.wikipedia.org/wiki/Existencialismo
https://pt.wikipedia.org/wiki/Niilismo
https://www.ufrgs.br/psicoeduc/filosofia-suicidio-camus/
https://sites.google.com/view/sbgdicionariodefilosofia/suic%C3%ADdio