terça-feira, 15 de junho de 2021

Dependência

A aula desta disciplina que mais permaneceu na minha cabeça, ao longo deste semestre, foi uma das primeiras e o assunto prendeu-se com a cultura e a eventualidade da mesma, a arbitrariedade da mesma, a necessidade que esta satisfaz.

Muitas vezes me questiono sobre isso. O que é uma vida sem cultura, por oposição a uma vida com cultura. Temo que muitas vezes nos estejamos a desligar do mundo, decifrando a nossa vida só através dos símbolos culturais.

É uma questão ingrata para mim, porque trabalho com cultura. Sou sortudo. O meu trabalho é entreter, ganhar dinheiro sendo criativo. O que quer que ofereça ao mundo, nesse contexto, visa a trazer ponderações, ideias, sensações e o que obtenho em troca, é retorno financeiro e uma sensação de completude.

Apesar disso, há uma sensação permanente que eu, e todo o mundo que vive e respira a cultura, os símbolos e elementos manifestados nas múltiplas artes como expressão de ideias, estamos a viver numa dimensão gasosa, sem contato com o real.

Mesmo retrocedendo milhares de anos na nossa história, até as primeiras pinturas rupestres, a existência destas não implica algum sedentarismo? Algum conforto com tempo disponível para reunir ossos, carvão, argila, pulverizá-los, misturar com sangue, excrementos de morcego, ovos ou outros aglutinantes… tudo isto não implica conforto?

Tenho medo que nos dias de hoje, se vivam vidas dependentes de uma satisfação cultural.

As experiências de vida, estas passam a ser cada vez mais de observação e não de experimentação. Não vejo crianças a brincar nas ruas. As pessoas relegam os cães à posição dos filhos. O conforto do streaming garante que não precisamos de nos deslocar a algum lugar para ver uma história ser contada. Escrevemos sobre a ânsia de vida de um pedreiro, informando-nos sobre o seu trabalho através de uma página da wikipedia sobre o processo de picar paredes.

E aqui estou eu, a escrever um objeto cultural sobre como a cultura é um vício perigoso de alimentar. Há distrações piores da falta de significado da vida. Ou então a cultura existe para procurar um significado.

O que eu gostaria de saber, é se somos criaturas de padrões e informação e temos a obrigação natural de aprender com esses padrões e registá-los para o futuro, não teremos também a obrigação de de vez em quando parar e tomar consciência de que se calhar, não há significado algum a decifrar?

Então o que restará nesse momento? Talvez o simples prazer de apreciar algo. Como um cão, a correr atrás de uma bola. Ele nunca questiona de onde ela é lançada. Só sabe que tem que correr atrás.